Um novo ano começa...

Desde sempre, celebrou-se com especial festa o Ano Novo ou a Passagem de Ano e, mais modernamente, o Reveillon. Já antes dos tempos bíblicos que esta tradição estava instalada e continuou a ser celebrada pelo Povo de Deus, com a tradicional Festa Anual do Senhor ou então a Festa das Tendas, que marcam não só o fim de um ano civil, mas também o fim do Ano Agrícola. Existem vários «Anos» que ocorrem paralelamente num ano civil, tal como o Ano Judicial, o Ano Fiscal ou, ainda, o Ano Lectivo. Assim como também existe o ano judaico, também existe um ano cristão e um ano «católico», que é conhecido por Ano Litúrgico. 

«Nativity», de J. Richards
Segundo o Concílio Vaticano II, o Ano Litúrgico é uma estrutura que celebra todo o mistério de Cristo, isto é, «da Incarnação e Nascimento à Ascensão, ao pentecostes, à expectativa da feliz esperança e da vinda do Senhor». [1]

É no ritmo semanal (hebdomada) cujo primeiro dia é o Domingo, em que se celebra o Mistério Pascal, prefiguração das Festas Pascais que constituem «o momento privilegiado do culto cristão no seu desenvolvimento quotidiano, semanal e anual» [2]. Por isso, a celebração do Domingo deve ser sempre um momento de paragem de celebração, pois ele é o «fundamento e o centro de todo o Ano Litúrgico» [3].

O Ano Litúrgico começa sempre com o Tempo do Advento, que por sua vez tem início com as Vésperas I do Domingo I do Advento, que ocorre no Domingo mais próximo ao dia 30 de Novembro, em que ocorre a Festa do Apóstolo Santo André. 

O vocábulo Adventum, aproveitado do vocabulário romano, era o tempo que ocorria entre a chegada do arauto e a chegada do Imperador. Era um tempo de preparação, de limpezas e de espera. Só no século IV, o termo Adventum começa a fazer parte do vocabulário cristão, com o Concílio de Saragoça (380). Aqui fixa-se que o Advento é o tempo que ocorre entre o primeiro domingo do Advento e a solenidade da Epifania, onde no meio se celebrava o Natal. Mais tarde fixaram-se dois tempos litúrgicos: o tempo do Advento (até ao Natal) e o tempo do Natal (até à Epifania). 

O Tempo do Advento tem uma dupla característica: a celebração da primeira vinda de Cristo à nossa história e dirigir o nosso espírito para a segunda vinda de Cristo, que terá lugar no Fim dos Tempos.

No meu entender, incluiria mais uma vinda: a vinda de Jesus ao nosso quotidiano, essas pequenas vindas ou momentos em que Deus nos visita e que nos leva a estar atentos àquilo que acontece à nossa volta e a descobrir nessas realidades o rosto de Jesus Cristo. Isto também é Advento. 

Enquanto que a Quaresma destaca-se por um tempo de penitência e de regresso a Deus, o Advento é um tempo de encontro com Deus nos outros, um tempo que nos convida a estar atentos e a dirigir o nosso olhar para as realidades que nos rodeiam e que também são lugar de revelação desta presença amorosa e cheia de ternura de um Deus que nos vem visitar. 

O Advento, infelizmente, tornou-se um tempo de preparação para as festas de família que, sendo uma iniciativa muito bela e importante, desviam o nosso olhar para as prendas, para os jantares, para o que vestir e quase que se esquece do mais importante, que é Jesus Cristo. 

O consumismo do nosso tempo desviam os nossos olhos da verdadeira essência do Natal, que é nada mais nada menos que a comemoração do Nascimento do Menino Deus, que nos vem trazer a Paz. 

Quando era mais pequeno, lembro-me de ir com os meus pais pelas ruas da minha terra e das terras vizinhas para ver os presépios que se faziam nos jardins das casas. Havia sempre a imagem do Nascimento de Jesus e até se discutia se já se devia colocar o Menino Jesus desde o primeiro dia ou apenas no dia de Natal. Hoje já poucas famílias têm a tradição de enfeitar as casas e quando as enfeitam substituem o presépio pelo pai natal ou pelo boneco de neve. 

Isto deve-se, sem dúvida, a uma cultura que nos foi imposta pelos grandes países, caracterizados pelo consumismo desenfreado, onde as prendas são mais importantes que a presença; onde a verdadeira festa é colocada de lado, transformando o Natal num feriado qualquer; onde a figura do Menino é substituída pelo pai natal, que a Coca-Cola inventou, pervertendo a figura de São Nicolau. Por isso, tudo o que tem origem cristã é substituída por outras figuras que são a imagem de marca do mundo comercial. 

No ano 2009, a Paróquia da minha terra e muitas outras incentivaram os fregueses a colocarem na sua janela um estandarte do Menino Jesus, para lembrar que é Ele o centro do Natal. É por causa d'Ele que trocamos presentes. É por Ele e pela Família de Nazaré que nos reunimos em família. Jesus é o centro do Natal.

No início deste Ano Litúrgico que começará no próximo Domingo, façamos o propósito de trazer de novo Jesus para o centro das nossas festas e das nossas vidas. É um bom propósito...

Ontem, num grupo que assisto, os jovens elaboraram «Os 12 desejos para a passagem do Ano Litúrgico», que aqui deixo e espero que seja proveitoso:

  1. Desejo tomar consciência de que Jesus é o centro da minha vida;
  2.  Desejo colocar a minha vida ao dispôr da vontade de Deus;
  3. Desejo servir cada vez mais a Deus, a Igreja e os seus movimentos;
  4. Desejo colocar os meus talentos a render em favor da minha comunidade;
  5. Desejo dar mais valor à criação de Deus e a cuidá-la;
  6. Desejo participar mais activamente nos Sacramentos, a rezar mais e a estar com mais atenção nos encontros;
  7. Desejo estar mais atento aos outros, sobretudo aos pobres e aos que sofrem;
  8. Desejo desinstalar-me da minha vida para ir ao encontro dos outros;
  9. Desejo estar mais tempo com a minha família;
  10. Desejo empenhar-me mais nos projectos de solidariedade e no voluntariado;
  11. Desejo cultivar uma amizade sincera com os meus amigos e, sobretudo, com os que não têm amigos,
  12. Desejo dedicar mais momentos do meu dia a Deus.
Que cada um de nós seja capaz de fazer os seus pedidos e desejos para este novo Ano que começa.

FONTES:

[1] CONCÍLIO ECUMÉNICO VATICANO II, Sacrossanctum Concilium, 102 - 103 (Braga, AO, 34)
[2] PAULO VI, Mysterii Paschalis, in AAS (1969) 222
[3] CONCÍLIO ECUMÉNICO VATICANO II, Sacrossanctum Concilium, 106 (Braga, AO, 34)

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