A oração de Jesus e a nossa

Imagem: J. Kirk Richards

1. Ver Jesus a rezar devia ser realmente algo tremendo e fascinante, uma vez que os próprios discípulos permaneciam ali a contemplar Jesus em oração. E nós devemos estar muito gratos a este discípulo anónimo que um dia, vendo Jesus orar, pediu-lhe que lhes ensinasse o dom da oração. O que o decidiu a pedir tal coisa foi ver Jesus orar! Olhando para Jesus, ele percebeu que havia uma distância entre a oração de Jesus e a sua própria oração. Talvez este discípulo se sentisse um pouco desamparado diante de Deus ou insatisfeito com as suas tentativas, ou até mesmo desanimado com os seus esforços. Em todo caso, em Cristo na oração ele viu a pobreza da sua própria oração. E foi aí que lhe veio a ideia de pedir uma lição: "Senhor, João Batista fez isso com seus discípulos, tu podes fazer isso por nós". Jesus, sê o nosso Mestre de oração.

Ao tomar Jesus como Mestre de oração, este discípulo anónimo chama à atenção para duas coisas. Primeiro, Jesus é um Mestre porque ele mesmo ora, então ele ensina por experiência própria. A segunda, Jesus é o Mestre porque ele ora melhor do que nós. Resumindo: ele reza e nós tentamos rezar.

2. Esta distância entre a nossa oração e a dele, Cristo a indica desde o início na sua lição: «Quando orares, dizei: Pai nosso». Ele não diz: «Quando oramos, digamos...», mas «Quando orardes, dizei...». Jesus não reza connosco, porque ele tem sua própria oração e nós temos a nossa. Jesus dirige-se ao Pai dizendo: "Pai" ou "Meu Pai", numa proximidade única, porque o Filho eterno é consubstancial — de uma só substância — ao seu Pai. Por outro lado, dirigimo-nos a Deus dizendo: “Pai nosso” ou “Deus nosso Pai”, ou “Pai de nosso Senhor Jesus Cristo”, porque somos criaturas e filhos adoptivos de Deus.

No restante da sua lição, Jesus retornará por fim à diferença mais marcante entre sua oração e nossa oração. Quando oramos, temos que pedinchar com Deus como Abraão diante da pecadora Sodoma, ser ousados, importuná-lo com nossos apelos. Temos que pedir, temos que buscar, temos que bater à porta. A nossa oração deve ser insistente, com firmeza. Cristo, ao contrário, nunca precisa insistir. Por exemplo, mesmo antes de ressuscitar Lázaro, ele reza assim: «Pai, eu te dou graças porque me ouviste. Bem sei que sempre me escutais” (Jo 11, 41). E esta oração é suficiente para Lázaro ressuscitar. Porque há tanta diferença entre ele e nós? E porque é que o nosso Mestre de Oração nos exorta a insistir?

3. Vamos começar com a primeira pergunta. Para entender essa diferença entre a oração de Cristo e a nossa, vamos primeiro lembrar o que é a oração. Quando oramos, apresentamos o desejo do nosso coração a Deus para que seja realizado. A oração é, portanto, o intérprete diante de Deus do que habita nas profundezas da nossa vontade. Como nós, Cristo orou. Isso significa que ele apresentou ao Pai o que habitava nas profundezas da sua vontade humana. Por exemplo, quando disse durante a Paixão: «Pai, perdoa-lhes», ele deseja ardentemente na sua vontade humana que o Pai perdoe àqueles que o crucificavam. Ora, esta vontade humana de Cristo tinha uma particularidade: sempre quis o que o Pai quer e por isso afirma: «o meu alimento, disse ele, é fazer a vontade daquele que me enviou». O meu alimento – isto é, aquilo que restaura as minhas forças e a minha vida – é fazer a vontade do Pai. Ou ainda: «Pai, não seja feita a minha vontade, mas a tua». Este modo de estar unido à vontade do Pai veio das profundezas da pessoa de Cristo. De facto, como Filho da natureza divina, ele tinha uma única vontade com o Pai. E como o Filho, ao entrar na nossa carne, tomou sobre si uma humanidade semelhante à nossa, ele tinha uma alma, tinha uma vontade, e todos os movimentos dessa vontade humana obedeceram em tudo à sua vontade divina. Não havia, se assim posso dizer, nenhuma distância entre o que Jesus queria nas profundezas da sua vontade humana e o que ele sabia que o Pai queria. E aqui está a razão pela qual ele foi respondido em sua oração: a sua vontade humana estava sempre em conformidade com a vontade de Deus. O que ele pediu de seu Pai foi o que seu Pai queria dar.

4. Tudo isto pode parecer um pouco complicado, mas basta comparar com a nossa oração para que as coisas fiquem mais claras. Vejamos o caso da intercessão de Abraão. Deus começa a reclamar diante de Abraão das falhas de Sodoma e Gomorra, e anuncia-lhe que vai visitar essas cidades. Assim, Abraão aproxima-se do Senhor – primeira condição da oração –, apresenta um pedido a Deus – segunda condição da oração –, e esse pedido é o intérprete do que ele tem no fundo do coração – terceira condição da oração. Isto é o que sai: “Deus realmente vai destruir o justo com o culpado? Deus julga toda a terra e, desta vez, não agiria de acordo com a lei? Por outras palavras, Abraão quer a justiça de Deus, uma justiça verdadeira como só Deus é capaz, uma justiça onde os justos são salvos. Observemos como Abraão colocou no seu coração o que ele sabe ser a vontade de Deus: "Visto que vós sois o Deus justo e salvador, quereis salvar o justo", e é querendo de acordo com o que Deus quer que ele vai formular a sua oração: "por cinquenta justos, poupa estas cidades, eu te imploro". Mas imediatamente ele se recompõe: eu pedi cinquenta justos, mas e se faltassem cinco, e se apenas quarenta e cinco fossem encontrados? E apenas trinta? E apenas vinte? E apenas dez? E quanto mais Abraão volta à carga, quanto mais se humilha, mais se atreve e quanto mais compreende a audácia desta oração que brota do seu coração, quanto mais regateia, mais descobre a profundidade da misericórdia de Deus, quanto mais ele tem a impressão de ser imprudente e inoportuno, mais o seu coração realmente se torna em conformidade com o que Deus quer cumprir.

5. Irmãos e irmãs, a oração é o caminho do nosso coração durante o qual ele aprende a bater ao ritmo da Salvação que Deus quer dar. É por isso que as nossas orações precisam ser insistentes e perseverantes. Não se trata de repetir mecanicamente como rodas de oração ou de harpa como os pagãos, porque não se responde pelo peso, pela quantidade ou pelo desgaste. A lição de Cristo sobre a oração mostra-nos, pelo contrário, que esta repetição é necessária para que a nossa vontade seja transformada, purificada, aprenda a desejar o que Deus quer no auge do seu poder e da sua misericórdia. Claro que não podemos rezar como Cristo, pois a sua vontade humana abraça e segue em tudo a vontade do seu Pai.

Mas porque está bem ciente dessa diferença connosco, Jesus concentra o seu ensino no movimento de aproximar nossa vontade da vontade de Deus, e resume esse movimento em três verbos: devemos pedir, buscar e bater à porta. Devemos pedir, porque devemos expressar diante de Deus os desejos do nosso coração para não ficarmos com intenções ou caprichos. Devemos buscar, ou seja, pedir com fervor a Salvação de Deus, para não ficar com pedidos mecânicos nos quais não colocamos o coração. Finalmente, devemos bater à porta do Senhor com todo o nosso coração como se tivéssemos que acordá-lo quando na verdade é ele quem nos envolve na sua vontade.

Precisamos pedir e pedir fervorosamente. Pedi e recebereis. Procurai e achareis. Batei e Deus será aberto para cada um de nós. Ó Jesus, Mestre da oração, não te canses de nos ensinar a rezar.

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