A presença muçulmana como já vimos foi a mais marcante no que toca a vestígios sociais e económicos, bem como alguns vestígios estruturais, tais como a estrada mourisca. O território que hoje Perosinho ocupa pertencia ao Condado de Coimbra e ao qual pertencia o Mosteiro de Grijó. Antes da divisão jurídica daquilo que conhecemos como Paróquia, Perosinho terá sido anteriormente administrada pelo Mosteiro de Moreira (Maia), numa primeira fase e depois agregado ao Mosteiro de Grijó.
Apesar de já haver alguma religiosidade em Perosinho, como podemos atestar pela datação da Capela de Nossa Senhora de Crasto (ou do Pilar), só no século XII é que aparecem documentos que falam de Perosinho como uma Paróquia de direito. Mas antes disso e como o Pe. José Ribeiro de Araújo retrata na sua obra, em Perosinho a religiosidade terá começado nos tempos romanos com a passagem do Apóstolo S. Tiago e, assim como toda a Península Ibérica, Perosinho também terá sofrido com as perseguições por parte da religião imperial e, também, algum tempo depois com a invasão árabe.
Como já foi dito, só no século XII, mais propriamente em 1132, é que Perosinho aparece como paróquia erigida canonicamente e com uma Igreja Paroquial, dependente, ainda, do Mosteiro de Grijó. Algumas fontes indicam que antes da construção da Igreja Paroquial, a Capela de Crasto, que data da época romana teria servido de Igreja Paroquial. Contudo, em 1914, foi descoberta uma lápide de mármore na frontaria da actual Igreja Paroquial, oculta sobre uma camada de reboco, que diz assim:
ESTA IGREJA DE SAN SALVADOR
DE PEROSINHO HE DO MOSTEIRO
DE IGREIO COM TODAS SVAS REN-
DAS E DIREITOS PLENO IVRE E
COM A IVRISDIÇAM ORDINARIA E
METROPOLITANA ASSI EM A DITA
IGREIA COMO SUAS PARROCHIAS
E PARROCHIANOS DELLAS E ESTO
LHE FOI CONCEDIDO E O PRIMEI-
RO ANO DA SVA FVDAÇÃ QUE FOI
DE NOSSO SENHOR IESV CHRISTO
A grande patrocinadora e fundadora da primitiva Igreja Paroquial foi D. Elvira Nunes Aurea, que era sobrinha dos fundadores do Convento de Grijó, ao mesmo tempo que construía as igrejas de S. Mamede (Serzedo), S. Martinho (Argoncilhe), S. Martinho (Travanca) e S. Miguel (Travassô). Após a construção doou-as ao Mosteiro de Grijó.
Porém, já que aqui se fala tanto do mosteiro de Grijó, penso que merece alguma nota mais especializada sobre ele. O mosteiro de Grijó, fundado em 922, foi fundado pelos Padres Guterres Soares e Ausindo Soares, mas os que nele viviam não tinham adoptado nenhuma Regra de vida monástica, vivendo simplesmente dedicados à oração, à penitência e a actos de caridade. Só por volta de 1130, D. Paio, abade do dito mosteiro, decidiu adoptar a Regra de Santo Agostinho e, por isso, pede ao Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra que lhes envie dois frades para implantar a Regra. São Teotónio, Prior do dito mosteiro, envia Dr. Fr. João Peculiar e o seu sobrinho D. Fr. Pedro Rabaldis, que chegaram a Grijó a 21 de Novembro de 1134, segundo as
Chronicas. Dois anos depois, D. Frei João Peculiar foi eleito Bispo do Porto e foi responsável pela desagregação das terras da Feira (tudo o que se situa acima do rio Antuã), passando a incorporá-las na diocese portucalense, como se mantém até aos nossos dias. Foi este que isentou o mosteiro de Grijó da jurisdição episcopal e cedeu-lhe as rendas de algumas igrejas, entre as quais a de Perosinho, isentando-a da jurisdição episcopal e fazendo-a depender directamente do Mosteiro. D. Frei João Peculiar foi, depois eleito Arcebispo de Braga, mas concedeu alguns privilégios ao Mosteiro de Grijó, tais como o uso por parte dos Priores das insígnias episcopais e o poder de conferir ordens menores. Para além destes privilégios, o Mosteiro tinha também um Vigário Geral, um Promotor de Justiça e a sua própria prisão (ou aljube). Civilmente, o Mosteiro tinha poder sobre os seus coutos, podendo administrar estes territórios.
Assim, a Igreja Paroquial de Perosinho esteve, desde 1136, sobre jurisdição do reformado Mosteiro de Grijó até 1834, aquando da expulsão das Ordens Religiosas.
Apesar de não haver - que se saiba! - registos de como era a igreja primitiva, acredita-se que possuísse um telheiro ou galilé e que fosse muito mais pequena. Numa visita feita pelo Prior do Mosteiro de Grijó, D. Lourenço da Conceição, em 1747, pode ler-se assim:
Atendendo nós a que a igreja desta freguesia é pequena a respeito do povo e que umas grades que têm os altares laterais lhe servem de impedimento para o bom comodo do povo, além dos inconvenientes que tem aos sacerdotes, quando devem celebrar a missa, ordenamos ao R. Parocho e Juiz da igreja façam em termo de 15 dias tirar as ditas grades e pôr a igreja mais desembaraçada para comodidade de todos, com cominação de que, não o fazendo, procederemos como nos parecer justiça.
Na altura, as igrejas não tinham mais que um campanário e apenas com um sino e em todos os documentos sobre o toque do sino na freguesia, como aponta o Pe. Ribeiro de Araújo, aparece a expressão «tanger o sino» e sempre no singular.
Em 1758, D. João IV terá pedido ao Pe. Luis Cardoso, que era Pároco de Perosinho, que escrevesse um dicionário geográfico e histórico do Reino de Portugal, o que começou a fazer, mas apenas terminou a letra «A». Os seus apontamentos foram compilados em alguns volumes que se conservam, ainda hoje, no Arquivo da Torre do Tombo. Publico aqui a carta que responde ao interrogatório que foi feito ao Pe. João Pinto Barbosa e que faz parte da já citada compilação:
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Igreja de Perosinho, depois das obras do ano 2000 |
Freguezia de Sam Salvador de Perosinho
(Gaia) PORTO
[...]
3- Tem duzentos e trinta fogos e seiscentos e quinze pessoas maiores, oitenta e três menores.
4- Está situada em pleno e baixo, tem pela parte do Nascente e Norte alguns pouco levantados montes e de algumas partes se descobre o mar, que dista ainda das mais próximas huma legoa e também se ve o mosteiro de Grijó, que fica para a parte do Sul, a distancia de huma legoa; tem esta freguezia meia legoa de distancia com pouca differença: tanto do nascente ao poente como do norte ao sul.
[...]
6- A igreja parochial está no meio da freguezia e tem as aldeias seguintes: Lugar da Igreja, Loureiro, Barrosa, Cazaria, Costa, Crasto, Guimarães, Muar, Sergueiros, Cazal, Pouzada, Brandaris, Boavista, Cal, Penna e Vestoria: que por todas fazem dezasseis.
7- O orago desta Igreja he Sam Salvador, padroeiro e titular desta freguezia. Tem esta igreja cinco altares. [...] Tem a irmandade do Santissimo Sacramento, de Nossa Senhora do Carmo, dos Descalços, das Almas, e da Sera, esta debaixo da proteçam de Sam Sebastiam.
8- o parocho desta freguezia he cura annual que apresenta o prelado do Real Mosteiro de Grijó, prior dos Conegos Regulares de Santo Agostinho, ao qual Mosteiro esta Igreja está unida.
[...]
13- Tem duas capellas. Huma de Nossa Senhora no lugar de Crasto, tomando o nome do mesmo lugar. Outra no lugar de Sergueiros, que é de Santa Marinha vigem martir. Tem só hum altar em cada huma destas capellas. Ambas sam publicas e pertencem à freguezia.
[...]
26- Nam padeceu ruina no terramoto de mil sete centos e sincoenta e sete.
Hoje ficamos por aqui. Iremos na próxima publicação abordar o património que a Paróquia possuía.
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