Onde está a nossa alegria?

Aguarela do Pe. Filipe Azevedo (Diocese do Porto),
disponibilizada na página da Diocese para usos pastorais


 «Veio como testemunha, para dar testemunho da luz,
a fim de que todos acreditassem por meio dele.
Ele não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz»

(cf. Jo 1, 6-8)

Todos nós já fomos fazendo ou ainda fazemos a experiência de estarmos rodeados de gente e mesmo assim sentir que estamos sozinhos e todos já fizemos a experiência quando tudo à nossa volta é alegria e nós estamos tristes. É a experiência que vamos fazendo cada dia e em cada tempo, porque alegria e tristeza andam sempre juntas e isso mostra-nos o Evangelho.

A alegria de que se fala hoje é uma alegria que é fruto do Espírito Santo, porque é o resultado de uma vida em Deus. Muitas vezes o nosso afastamento de Deus, torna-nos tristes. Mas, «pior que um santo  triste é um triste santo», como diz a sabedoria popular ou como diz o Papa Francisco que «existem cristãos com cara de "vinagre" ou com cara de Sexta-feira Santa. E às vezes a tristeza faz crescer em nós aquele mecanismo de defesa que nos torna ásperos e arrogantes com os outros, que nos torna indelicados e «vinagrentos».

O Domingo de hoje é conhecido como o «Domingo da Alegria» ou «Domingo Gaudete», porque a antífona de entrada desta missa começa assim mesmo: «Gaudete semper in Domino», retirada da Epístola aos Filipenses e cuja tradução é: «Alegrai-vos sempre no Senhor». No meio da nossa noite, da nossa tristeza, do nosso cansaço e desalento, surge uma voz que nos recorda: «Alegrai-vos»!

É esta alegria que é a identidade do cristão; não o azedume, não a arrogância, não a aspereza, mas a alegria. Uma vida em Deus e com Deus só pode ser uma vida cheia de alegria. Por isso, o convite de hoje é claro: «Alegrai-vos!».

Na 2ª Leitura, São Paulo escreve aos cristão de Tessalónica e dá-nos o mote para a vida cristã, que é tudo muito simples: vivei sempre alegres, orai sem cessar e dai graças continuamente. Se quisermos classificar o cristão, se quiséssemos traçar um perfil era isto mesmo que diríamos: o cristão é aquele que vive sempre alegre, que ora sem cessar e que dá graças continuamente. 

No fundo, é a isto que somos chamados: a uma vida feliz e bem-aventurada. Somos constituídos por Deus para sermos profetas da alegria e da esperança, mesmo num mundo que vive cheio de tristeza e desalentado. E isto passa por ser a voz d'Aquele que é a nossa alegria e esperança, passa por sermos a voz de Jesus no meio do deserto do Mundo.

É assim que surge no Evangelho a figura de João Baptista, que deixa bem claro o seu lugar e a sua missão quando lhe perguntam: «Quem és tu?».

«Eu sou a voz do que clama no deserto», responde ele com toda a humildade e toda a sinceridade. Ele sabe que não é o personagem principal da história de amor que Deus escreve com o seu povo: Ele sabe que não é a Palavra - o Verbo -, mas a voz; ele sabe que não é a Luz, mas que veio para dar testemunho da Luz; ele sabe que baptiza com água em sinal de penitência, mas que Jesus baptizará no Espirito Santo que dá vida. 

E em nada a missão de João Baptista é diminuída ou humilhada por não ser o centro das atenções, mas apenas aquele que dá testemunho de Alguém maior e isto converte-se na sua maior alegria: ser o percursor d'Aquele que vem para salvar a todos.

Também nós somos chamados a ser a voz d'Aquele que é o Verbo, não para que nos sintamos diminuídos na Missão que Deus nos aponta, mas porque ser o percursor de Jesus nos enche de verdadeira alegria. 

E o que vemos nós? Nem sempre vemos no rosto dos cristãos a alegria de anunciar Jesus, porque caímos na tentação de querer ser o centro das atenções, queremos ocupar o melhor lugar na comunidade, queremos ter voz em tudo, queremos que a nossa palavra seja a última e a que tem valor. Quando isto não acontece, vem o desânimo, o desalento e vamos «avinagrando» e tornando as nossas relações ásperas.

Que bom é saber que temos o nosso lugar! Que bom é saber que não somos nem melhores nem piores que os outros! Somos o que somos e é assim que Deus nos ama e é assim que Deus, sabendo o que somos, nos constitui profetas e percursores da vinda de Cristo à nossa vida e história de todos os dias.

E Isaías exprime o que é ser enviado por Deus: Não é o meu espírito, mas o «Espírito do Senhor» que está sobre mim! Não fui eu que me ungi e me propus a ir, mas o Senhor é quem me unge e envia. É isto que nos torna alegres: Ser escolhidos por Deus para anunciar que a salvação está perto aos pobres, aos cativos, aos que vivem subjugados pelo pecado. A escolha e a missão não é nossa, mas de Deus. Deus chama-nos para viver na alegria de sermos estes seus mensageiros, preparando o caminho e testemunhando a alegria de que a nossa salvação está perto.

Queridos irmãos, 

à semelhança de João Baptista somos convidados, neste dominfo, a perceber o nosso lugar no mundo, na igreja e neste Reino de Deus que se aproxima, descobrindo que a nossa verdadeira alegria está em ser escolhido por Deus para dar testemunho da luz que brilha em nós desde o nosso Baptismo, mas que é reflexo desta LUZ que é o próprio Jesus. Tenhamos a coragem de ser testemunhas, com palavras e obras, da alegria que nos vem de termos sido salvos em Cristo, vivendo sempre alegres, orando sem cessar e dando graças continuamente, tal como nos dizia o fr. José Augusto Mourão:

Cantai a Deus a plena voz,
dançai com Deus que dança.
A toda a Terra se estendeu
a Tenda da Aliança.

Olhou-nos Deus no Filho,
o Sol nos visitou e aqueceu.
Agradecei a graça.

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