Hoje [mesmo]!
«Em verdade te digo: hoje [mesmo] estarás comigo no paraíso»
και ειπεν αυτω ο ιησους αμην λεγω σοι σημερον μετ εμου εση εν τω παραδεισω
Aqui no convento, no passado domingo, cantamos um cântico que dizia assim: «há mais alegria no Céu por um pecador que se arrependa, do que por muitos justos que não precisam de perdão». É este o resumo desta passagem bíblica.
Dois ladrões, dois malfeitores, dois homens que fizeram o mal e, por isso, sofrem o castigo. Estes dois homens significam a humanidade, na qual Jesus incarna. Jesus está no meio desta humanidade, no meio destes dois homens. É uma analogia perfeita dos que aderem à Sua mensagem, ao seu Evangelho e daqueles que a rejeitam e ignoram, porque mergulhados no espírito mercantilista do mundo: um comércio desenfreado que procura resultados rápidos e eficazes, mas que não pensa a longo prazo.
O «mau ladrão» simboliza este homem persuadido pelas coisas terrenas, por aquilo que traz felicidade imediata, pela fama, pela auto-referenciação, pelo egocentrismo. Isto leva a ver em Jesus um milagreiro, um falhado, um mentiroso. «Se tu és o Cristo, salva-te a ti mesmo, e a nós», dizia ele. Quantas vezes não construímos um Jesus à nossa imagem e semelhança? Quantas vezes não experimentamos Jesus? Sim, quantas vezes não lhe dizemos: «Se tu és o Filho de Deus, porque permites isto ou aquilo»? Quantas vezes não somos nós o «mau ladrão»?
Por outro lado, o «bom ladrão» tem consciência do que fez e, por isso, abandona-se nas mãos de Jesus. Não pede que Jesus o salve daquele suplício, mas faz-lhe um pedido: «Jesus, lembra-te de mim no teu Reino». Não pede que o acolha, não pede que o salve, não pede que o tire dali, não pede que o faça descer da cruz, mas que apenas se lembre dele. Tal como o centurião que se aproxima de Jesus e lhe diz: «Senhor, eu não sou digo de que entres na minha casa. Mas diz uma palavra e o meu servo ficará curado» (Mt. 8, 8), assim Dimas diz: «Lembra-te de mim».
Não é o pecado que importa a Deus, mas o arrependimento. Na verdade, Cristo não olha o pecado, mas o pecador e aqui recordo a profecia de Ezequiel que diz: «Por minha vida – oráculo do Senhor Deus – não tenho prazer na morte do ímpio, mas sim na sua conversão, a fim de que tenha a vida. Convertei-vos! Afastai-vos desse mau caminho que seguis; porque persistis em querer morrer, casa de Israel?». (Ez. 33, 11).
Quando reconhecemos o mal que fazemos, quando nos colocamos diante de Jesus «despidos de todos os mantos», tal como diz Sophia de Mello Breyner, e reconhecemos a nossa fragilidade, então abre-se o caminho para o paraíso, abre-se o caminho para a recordação daquele filho ou filha querida de Deus que se arrepende e volta a casa.
Gosto de acrescentar, nesta passagem, a redundância. «Hoje [mesmo] estarás comigo no paraíso». Gosto de saborear o pensamento de que o hoje de Deus é o agora da nossa existência. Não é só hoje, mas hoje mesmo; não é só o agora, mas o agora mesmo. Perante uma cultura que pensa que seguir a Cristo é algo que só terá frutos no futuro, perante uma sociedade que procura saciar-se do imediato, esta redundância arrasa com todos esses pensamentos: é o HOJE [MESMO]!
A salvação opera-se hoje [mesmo], agora [mesmo]. Não é amanhã, não é daqui a pouco, não é daqui a umas horas, mas HOJE [MESMO]. Deus não espera a ver se voltamos atrás - até porque ele sabe de que barro somos formados - , mas opera no mesmo momento em que nos dirigimos a Ele porque se compadece, porque perdoa, porque nos conhece, porque ama.
E eis que este Filho de Deus, pregado numa Cruz, tratado como um malfeitor não deixa de ser quem é, não deixa de fazer o bem, não deixa de perdoar, não deixa de amar.
Quando estava a ler e a pensar no que iria escrever, vinha-me à mente a figura de São Domingos que, segundo os seus biógrafos, passava horas em frente de um crucificado a chorar e a gritar: «Meu Deus, que será dos pobres pecadores?». É esta oração diante da Cruz que tantos santos e tantos místicos cultivaram ao longo das suas vidas. São Tomás de Aquino que dizia que tudo o que tinha escrito não era nada comparado ao que tinha visto ao contemplar a Cruz de Cristo e Santa Catarina de Sena que, ao olhar para a Cruz, apenas repetia: «O meu doce Jesus tão cruelmente cravado».
E eu? Que peço a Jesus? Qual a minha oração perante ele? Porque não me converto hoje [mesmo]? Porque não abraço aquela Cruz?
Jesus, lembra-te de mim!
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