Cuidadores da Vida

«Quando acabava a série dos dias de festim, Job mandava chamar os filhos para os purificar e, levantando-se na manhã seguinte, oferecia um holocausto por cada um deles, porque, dizia ele 'Talvez os meus filhos tenham pecado, ofendendo a Deus no seu coração. 
Assim fazia Job todas as vezes.»
Job 1, 1-5

Job, nos primeiros versículos é apresentado como um homem normal, pai de família, dono de terras e de gado: uma imagem típica de um homem do tempo. Tinha prosperidade e uma família que, segundo o autor, vivia bem e se dava bem, dado que faziam vários banquetes. 

Mas Job, apesar desta prosperidade e alegria familiar, era temente a Deus e, por isso, sempre que havia um banquete, purificava os filhos (a tradução hebraica literal é santificar) e oferecia um holocausto ao Senhor. Isto propõe-nos uma leitura de que Job não seria apenas um pai de família, mas também um sacerdote, tal como era costume num regime patriarcal. Por isso, não só purificava/santificava os filhos, como também oferecia um holocausto para expiação dos seus pecados. 

Extrato da «Haggadah», uma das bênçãos
Na cultura hebraica, durante as refeições tinham de fazer certas orações e bênçãos que facilmente se esqueciam e que não eram ditas na sua totalidade. Ora, Job pede perdão a Deus não tanto pelos banquetes que ele e a sua família organizavam, mas porque talvez ter-se-iam esquecido de recitar a totalidade das ditas orações e bênçãos.

Isto leva-nos a reflectir sobre a nossa própria conduta de vida. Job, temente a Deus, oferecia continuamente estes sacrifícios para que, se de algum modo ele e os seus filhos, tivessem ofendido a Deus, Deus pudesse perdoá-los e, assim, voltar à normal relação com Deus. 

Mais, este trecho leva-nos a reflectir sobre a nossa consciência de pecado, isto é, leva-nos a pensar nas nossas falhas e nas nossas limitações. Claro que não é preciso andar sempre a pensar no pecado, a pensar se andamos a pecar... simplesmente não viveríamos. 

Mas esta atitude de Job pode levar-nos a pensar que a atitude mais importante que o pecado é a da reconciliação: com Deus e com os irmãos. 

A vigilância da nossa vida é um elemento estruturante e até pedagógico, pois faz-nos parar, pensar e corrigir aquilo que não está tão bem na nossa vida, coisas que até podem ser minúsculas, mas eu acredito que é nas pequenas coisas que se podem construir e consolidar as grandes mudanças. 

Assim, a Quaresma transforma-se num momento privilegiado para dar atenção à vida e à nossa conducta, à nossa boa conducta. Que Job seja um modelo para este tempo favorável da Quaresma, este homem atento e zeloso pelo seu bem e pelo bem da sua família. 

Sejamos cuidadores da vida, nossa e dos irmãos. Não para nos intrometermos na vida dos outros, mas para os ajudar e auxiliar naquilo que mais precisam. Isso é ser cuidador.

Ponhamos pés ao caminho...

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