Defensor VS Acusador

«Reparaste no meu servo Job? 
Não há ninguém na terra como ele: 
homem íntegro, recto, que teme a Deus 
e se afasta do mal»
Job 1, 6-12

No trecho de hoje, Deus fala com o inimigo, Satan, que é a personificação do mal. Parece que Deus se vangloria com Job, mostrando-o a Satan como o seu melhor fiel, mas o mal duvida sempre do bom e do que o pratica e aparece como o acusador dos irmãos. Aqui, tanto Deus como os Anjos - entre os quais Satan - aparecem sobre a forma humana (seres antropomórficos).

A confiança de Deus em Job parece ser inquebrável, dado que é o próprio Deus quem faz a proposta de pôr à prova Job. Porém, é interessante ver a postura de Satan quando responde a Deus: «Porventura Job teme a Deus desinteressadamente?», isto é, Job não temerá a Deus porque Deus esteve sempre do seu lado e lhe deu a riqueza e o bem-estar necessário?

O acusador propõe que se mude a sorte de Job, que lhe tirem os bens, que lhe tirem os rebanhos, que lhe tirem aquilo que ele mais preza. Deus aceita, mas coloca uma premissa: Satan não poderá tocar na sua pessoa, isto é, tocará em tudo, excepto em Job, na sua pessoa e causar-lhe qualquer dano.
Neste contexto surgirão duas grandes provações a que Job vai responder...

Na nossa vida, também é assim. Há um acusador, aquele que tem inveja, aquele que nos quer mal e que nos acusa de ser interesseiros, de fazer isto ou aquilo porque estamos bem na vida, assim o mal poderá acusar-nos e dizer que não amamos tanto o bem como dizíamos.

O pecado cega-nos, a inveja cega-nos, cedemos muitas vezes à tentação de esquecer a Deus quando a vida nos corre bem, mas também se pode cair no contrário, ou seja, utilizar Deus para as nossas necessidades, uma espécie de «Deus ex machina», tal como diria Bonhoffer, um Deus que vem em auxílio, um Deus socorrista que precisamos, utilizamos e rapidamente nos esquecemos dos benefícios que nos concedeu, à semelhança das tragédias gregas.

Mas, centremos a nossa atenção em Job: O tentador, o acusador está sempre à espreita a ver se cometemos infidelidades para nos acusar, tal como afirma S. Pedro: «O vosso inimigo, o demónio, anda à vossa volta como leão que ruge, procurando a quem devorar». Ora, como diz um irmão cá de casa, «o mal não precisa de adeptos, já há muita gente a fazer o mal». De facto, os cristãos devem ser adeptos do bem, do que é bom e agradável, do que é recto.

A confiança que Deus tem em Job, é por causa da garantia de que Ele mesmo estaria com Job, mesmo nas tribulações. O «temente a Deus», ao qual se refere o texto, não é o facto de Job ter medo de Deus, mas é aquela confiança de que Deus o assiste sempre e sempre o perdoa. Neste sentido a palavra «Temente» poderá ter dois significados: aquele que tem medo a Deus - que não me parece nada a atitude de Job - ou aquele que arrisca, que é ousado. Afirmo que a atitude de Job está entre os dois: Job é aquele que tem medo mas, como confia em Deus, arrisca. 

O nosso Deus não precisa de ser temido, precisa de ser amado e com tal intensidade que jamais precisaremos de ser adeptos do mal para estarmos bem na vida.

Assim também nós, neste tempo da Quaresma, precisamos de voltar a Deus, de O temer e, sobretudo, de O amar e assim como Deus tem confiança em nós e nos perdoa sempre, devemos nós colocar a nossa confiança em Deus, tendo presente que Ele nunca nos abandona e, mais, mesmo quando o mal nos bate à porta, mesmo aí Deus está presente não para nos acusar - essa é a tarefa do mal -, mas para nos defender.

Ponhamos a nossa confiança em Deus que confia em nós, mesmo apesar dos nossos erros...

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