O Caminho Quaresmal...
Meus caros amigos leitores,
à semelhança dos anos anteriores e a pedido -
note-se! - de alguns leitores atentos deste blog, iniciarei amanhã o meu
caminho quaresmal. Este ano, para não repetir o modelo anterior, caminharei à
luz do Livro de Job.
Não raras vezes, a literatura sapiencial é posta
de lado, por ser difícil, por não haver assim um tema concreto ou,
simplesmente, porque nunca gostaram de pregar sobre ela, o que é uma pena.
Confesso que, quando andei na biblioteca à
procura de literatura sobre Job, encontrei muito pouco, ainda que haja obras
muito genéricas e de explicação deste livro, mas concretamente sobre Job, muito
pouco. Por exemplo, de toda a Patrologia, só encontrei dois Padres da Igreja
que escreveram sobre Job: Gregório, o Grande e São João Crisóstomo. Não
estranhem que faça referências a estes dois autores: primeiro porque a
Patrística é uma área de interesse pessoal e, em segundo, porque o meu autor
favorito é precisamente João Crisóstomo. Ora, juntando o útil ao agradável,
haverá muitas situações em que citarei estes Padres.
Então, a ideia é percorrer o livro de Job de
forma continuada, i.e., uma leitura continuada, meditada e, sobretudo, rezada
deste livro, fazendo um ponto de encontro entre a literatura propriamente dita
e o tempo que amanhã começaremos, ilustrando com uma imagem, como vem sendo costume.
Aproveitando esta postagem, quero ressaltar os
pontos essenciais da Mensagem do Papa Francisco, sobre o tema: «A Palavra
é um dom. O outro é um dom», mas ninguém se ache dispensado da
leitura integral do documento que pode encontrar AQUI (clicar).
Em primeiro lugar, o Papa diz que a «a
Quaresma é um novo começo», ou seja, é uma oportunidade para finar, para
mudar pequenas coisas que não estão bem na nossa vida, sejam materiais ou
espirituais e, por isso, este tempo «Não cessa de nos dirigir um forte apelo
à conversão». Para tal, a Igreja coloca à nossa disposição meios para nos
ajudar neste caminho: Jejum, oração e esmola.
Seguidamente, o Papa faz uma hermenêutica do
texto de São Lucas, o conhecido episódio de Lázaro e do rico. Desta análise,
destaco os seguintes pontos:
1. São-nos apresentados os dois personagens, mas
é o pobre Lázaro que aparece mais detalhadamente e, por isso, não nos é um
personagem anónimo. O seu nome significa «Deus ajuda!». Por isso, diz o Papa, «não
se trata de uma pessoa anónima; antes, tem traços muito concretos e aparece
como um indivíduo a quem podemos atribuir uma história pessoal». Por isso,
o Papa chega à conclusão de que, por isso, «Lázaro ensina-nos que o outro é
um dom».
2. Neste quadro, a Quaresma aparece-nos como uma
oportunidade de abrir portas, isto é, de reconhecer no outro - que é dom - o rosto
de Cristo. Isto descobre-se com a Palavra de Deus, que «nos ajuda a abrir os
olhos para acolher a vida e amá-la, sobretudo quando é frágil».
3. Neste tempo de Quaresma, em que somos chamados
à conversão, temos de ter presentes que o pecado destrói a dignidade e fá-lo em
três momentos sucessivos: «amor ao dinheiro, a vaidade e a soberba». O
Papa não só nos alerta para a importância da conversão, mas para a necessidade
de estarmos atentos a esta degradação que o pecado nos faz.
4. Num momento mais conclusivo, o Papa Francisco
afirma que o verdadeiro problema do rico - e eu acrescento o nosso problema - é
«não dar ouvidos à Palavra de Deus». Não estar abertos à escuta da
Palavra de Deus, leva-nos a fechar o coração ao próximo e a centrarmo-nos no
nosso eu.
5. Por fim, o Papa faz um apelo a todos os
cristãos a deixarem-se converter e que a participação nos sacramentos, a escuta
da Palavra de Deus e as obras de misericórdia nos ajudem a descobrir a riqueza
que vem de Cristo, através do outro.
O tempo da Quaresma que hoje inauguramos, com
este sinal das cinzas, quer significar isso, uma mudança de vida e de conduta
que nos aproxime de Deus e que nos faça chegar a ele de coração
purificado/santificado. Por isso, a antífona que acompanha este símbolo é
«Immutemur habitu», v. gr., mudemos de hábitos/conduta.
Quando nos são impostas as cinzas, aquele que as
impõe diz: «Lembra-te que és pó e em pó te hás-de tornar» ou «Arrepende-te e
acredita no Evangelho». Estas fórmulas «constituem uma evocação da verdade
acerca da existência humana: somos criaturas limitadas, pecadores sempre
necessitados de misericórdia» (Homilia de Quarta-feira de Cinzas do Papa
Francisco, na Basílica de Santa Sabina, 18/02/2015).
Que este seja o nosso desejo, mudar de hábitos,
de rotinas, de vícios ou, no fundo, mudar de vida. Este é um tempo propício a
essa mudança de vida. Que as cinzas que hoje
nos impõem sobre a cabeça seja um sinal desta vontade e, sobretudo, que nos
recorde que a nossa vida é pó, mas um pó que se torna barro e que é modelado
pelas mãos do próprio Deus.
Ou ainda, nas palavras do Papa, «o convite à
conversão constitui um impulso a voltar, como fez o filho da parábola [Filho
Pródigo], aos braços de Deus, Pai terno e misericordioso, a chorar naquele
abraço, a confiar nele e a entregar-se a Ele» (idem, 18/02/2015)
Pax Christi!
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